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Opinar é tudo o que se quer
Opinião

Opinar é tudo o que se quer

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Tipo Notícia


As cobranças por opinião nunca foram tão rápidas. Na velocidade da web, as pessoas se sentem compelidas a emitir opinião sobre qualquer coisa a qualquer momento, seja lá qual for a pauta. Em tempo de Fla x Flu político, ou melhor, judicial, como hoje, este cronômetro opinativo dispara sem dó.


Muita opinião, muitas respostas, sem nem sequer fazer perguntas antes. O fast food das certezas serve tudo ao gosto do cliente, com ou sem sal, mas temperado com o sabor do acolhimento. Sim, com a bandeja na mão fica-se a procurar iguais entre ninguéns para provar da mesma comida.
 

O cardápio varia de cor. Pode ser encarnado (ainda que vegetariano) e pode ser preto, branco ou amarelo. O que importa não é a iguaria, mas a companhia. Poder dividir com o outro afim, ora a leitura do fracasso ora o festejo da vitória.
 

É preciso saber degustar a solidão para ter opinião. Das mesas, do trabalho ou da própria casa. Sim, você já não está mais na escola em busca de aceitação. Tem todo o direito de odiar aquela série que todo mundo pergunta se você já viu ou ainda revelar que não gosta do Jorge Drexler (aliás eu gosto).
 

E mais: é possível pensar exatamente o oposto dos seus colegas em relação à política, ou melhor, ao crime organizado. Pode não se comover com aquelas pessoas em São Bernardo do Campo em torno de Lula por achar simplesmente que elas são mais do mesmo. Que não fazem autocrítica e se comportam como uma seita. E, sendo seita, incapazes de tabular um diálogo. Afinal, sendo seita, apenas bradam cânticos, praticam adoração e satanizam o entorno.
 

Ou ainda, está permitido torcer por um time, não odiar seu adversário sagrado campeão e julgar a sua própria torcida como ingrata e injusta. Justamente porque é dada às açodadas sentenças. Seja quando demite o treinador que mais tarde se torna seu algoz ou quando exige desempenho de Ferrari com motor de QQ.
 

Poderia falar das opiniões rápidas e bem intencionadas sobre desigualdade. Ante os dados, tome crítica à desigualdade, embora o problema seja outro, a pobreza. Sim, dois conceitos diferentes.
 

Por óbvio, é possível termos uma sociedade com bastante desigualdade, contudo, com muito pouca pobreza. Ou pode ter sociedades com nenhuma desigualdade, mas extremamente pobres, como algumas nações do continente africano. São países miseráveis, mas com baixa desigualdade porque poucas famílias são ricas. Ou seja, são iguais na miséria.
 

A propósito de pobreza, você pode olhar para os números e se sentir compelido a considerar mais justo cobrar dos governos escolas de melhor qualidade para que todos tenham acesso a bom ensino. Todos, sem distinção de pele. Isto porque ainda que tenha vergonha do modo desumano pelo qual a sociedade tratou oficialmente os negros até outro dia, no século XIX, ou no dia a dia em tantas situações, você tem o direito de rejeitar qualquer espécie de política compensatória baseada na cor da pele.
 

Tem mais e mais. Tem todo o direito de achar engraçado aqueles parlamentares do PT pedirem para pôr Lula no meio do nome de guerra deles, como forma de gerar comoção entre si e mídia espontânea ao líder. Tanto quanto a resposta da outro banda, ao propor inserir Moro ou Bolsonaro.
 

Você tem o direito de não ter opinião sobre nada disso por ora.

 

 

Jocélio Leal

leal@opovo.com.br
Jornalista do O POVO

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