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Viva a diferença na Academia
Opinião

Viva a diferença na Academia

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Tipo Notícia

A chegada do PT ao Poder e sua longa Era de 13 anos - posse de Lula em 1° de janeiro de 2003 e impeachment de Dilma em 31 de agosto de 2016 - tiveram um efeito colateral importante. Acabou o pretenso monopólio da pureza, néctar do discurso do partido quando oposição. E gerou outro fruto, já nos seus estertores.


Ganharam corpo na Academia manifestações ideológicas diversas de outro “monopólio”, o ideológico. O fracasso petista com sua “nova matriz econômica”, cujo preço pagamos caro até hoje, e ainda pagaremos adiante, foi o motor.
 

Outro dia, pude ver e me surpreender com um time expressivo de jovens estudantes de Economia da Universidade Federal do Ceará (UFC) reunidos no crepúsculo de um sábado à tarde em um grupo de estudo. À mesa, a possibilidade de pensar o mundo com viés liberal. Nada mais natural a pluralidade nos campi. Mas sabemos nós do histórico pensamento acadêmico hegemônico.
 

Antes comparado ao Vingador da Caverna do Dragão, Mumm-Rá dos Thundercats, Pinguim, Charada e Satã, o pensamento dito neoliberal emergiu sem culpa. No Ceará, por exemplo, a agenda positiva do governador petista se baseia em concessões. Se não tanto ao mar, nem tanto à terra (a propósito, há um porto ouvindo a conversa), mas com o privado como agente econômico determinante.
 

E agora, eis que chama a atenção a iniciativa de estudantes de Jornalismo e um professor da mesma UFC, a uns 500 metros da Faculdade de Economia. Eles formaram um grupo de estudo por se dizerem oprimidos pela maioria de esquerda do curso. Uma iniciativa, claro, que tem provocado polêmica no ambiente acadêmico.
 

A própria existência da polêmica prova o que o grupo aponta. A ideia do  projeto “Diálogos Com-política” é debater a conjuntura política do País.
Conheço aquele campus. Antes da Pós-Graduação, o frequentei na graduação além do que deveria. O curso de quatro anos foi concluído em seis anos. Pois é, havia quem perguntasse se era Medicina. É que comecei a trabalhar cedo.
 

Como a larga maioria dos cursos na área, era bem leve. Raso até. Como em geral são as graduações de jornalismo. Compensou pelo valor de alguns de seus professores, ainda que outros tenham deformado a visão de mercado daquele coletivo de garotos imaturos. Mas nada que não pudesse - e não tenha sido - corrigido com dois tempos de vida real.
 

Aquela vida real sobre a qual Cláudio Abramo tão bem escreveu em “A Regra do Jogo”, o clássico que mais tarde mandava meus alunos lerem para o caso de serem jornalistas ou marceneiros. Era de ética que ele falava. Para Abramo, cujo hobby era fazer móveis, a ética era uma só. No jornalismo ou na marcenaria.
 

Dizia o velho Abramo do armistício a ser assinado consigo próprio. Sobre jornalismo ser um meio de ganhar a vida, um trabalho como outro qualquer, uma maneira de viver, não uma cruzada. Noutros termos, nada que destrua convicções, mas que considere a lealdade à empresa onde atua como valor.
 

No último dia 12, aqui no O POVO, André Haguette (UFC) professava: “A universidade não é igreja nem partido”. Por trabalhar com a razão questionadora, inquieta, ponderava, se diferencia da igreja e dos partidos. A igreja alimentada da certeza da doutrina e o partido político, de seus interesses. Pois bem, ao discutir o mundo por outras lentes, aquele grupo da UFC está fazendo jornalismo puro.

 

Jocélio Leal
leal@opovo.com.br
Jornalista do O POVO

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