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Simulacro em borbotões

2017-09-17 00:00:00

A semana terminou com a segunda denúncia do procurador-geral Rodrigo Janot, contra o presidente imposto, Michel Temer, considerado por ele “chefe da quadrilha” do “PMDB da Câmara”, integrada, também, por seus sócios: Eduardo Cunha, Henrique Alves, Geddel Vieira Lima, Rodrigo Loures, Eliseu Padilha e Moreira Franco. Todos acusados de praticarem ações ilícitas em troca de propina por meio da utilização de diversos órgãos públicos, como Petrobras, Furnas, Caixa Econômica, Ministério da Integração Nacional e Câmara dos Deputados. Outra acusação contra Temer foi a de crime de obstrução à justiça, por causa de pagamentos indevidos para evitar que Lúcio Funaro firmasse acordo de colaboração premiada. Bem como de instigar Joesley Batista a pagar, por meio de Ricardo Saud, vantagens a Roberta Funaro, irmã de Lúcio Funaro. Os três são denunciados por embaraçar as investigações de infrações praticadas pela “organização criminosa”. Contudo, as trapalhadas do próprio Janot, na delação da JBS, abriu brechas para eventual invalidação da denúncia contra o presidente biônico.
 


CONTRAPESO
 

A semana incluiu, entretanto, como contrapeso ao embaraço do sistema frente a sua própria obra (agora novamente exposta por Janot), o segundo interrogatório do ex-presidente da República Luís Inácio Lula da Silva, em Curitiba, num processo marcado por absoluta falta de provas sobre as acusações apresentadas pelos procuradores da Lava Jato – segundo parte respeitável da comunidade jurídica. Quem assistiu, horrorizou-se com o aparente amadorismo dos interrogadores, que protagonizaram uma inquirição repetitiva e massacrante, desenhada, ao que pareceu, para fazer o réu perder a cabeça ou provocar-lhe sensação de humilhação. Provas, no entanto, – que seriam o esperado – não apareceram, mais uma vez. Tudo girou em torno da palavra de delatores pressionados a acusar Lula para se livrarem da cadeia, como vem sendo denunciado pela defesa e mais de uma centena de operadores do Direito que se debruçaram sobre o processo e expuseram seu absurdo jurídico, mês passado.

CORRESPONSABILIDADE
 

Quanto a Rodrigo Janot, sairia chamuscado do cargo que ocupou, não só por ter perdido o controle sobre seus subordinados, mas, por omissões e vacilações (que muitos estendem, também, ao STF). Falhas que terminariam por levar a quadrilha, referida por ele, a ter a ousadia de tomar o poder de forma criminosa e ilegítima, com apoio dos tucanos, para impedir o prosseguimento da Lava Jato, dando espaço e tempo para o golpe parlamentar ser articulado e executado por gente cuja ficha suja era conhecida de todos: das instituições da República aos empresários do pato amarelo – apontam os críticos. Este último segmento foi copartícipe na trama da destituição ilegítima, sem crime de responsabilidade, da presidente eleita pelo povo, para colocar em seu lugar a quadrilha ora denunciada como tal. Preferiram destruir o País, retirar direitos dos trabalhadores e entregar as riquezas nacionais à cobiça estrangeira, conquanto fosse destituído o governo que bancava o modelo econômico inclusivo, nacional e sociodesenvolvimentista,
do qual discordavam.

OPORTUNIDADE
 

Abriu-se, agora, depois do escancaramento da farsa, a oportunidade para o Judiciário reconciliar-se com a plenitude do Estado Democrático de Direito, acatando as ponderações da presidente eleita Dilma Rousseff, no sentido de anular o impeachment, reconhecidamente viciado pela compra de grande parte dos congressistas por um esquema corruptor, confessado pelos próprios corruptores, como a JBS. No entanto, vê-se o procurador-geral insistir num caminho que esfacela a democracia brasileira, ao se manifestar contrário ao pedido justo da presidente deposta: “O processo de impeachment foi autorizado e conduzido com base em motivação idônea e suficiente, não havendo falar em ausência de justa causa” – insiste ele. São palavras sobre as quais, provavelmente, terá de responder perante a História.

DESVIO
 

Certo, o PT também tem que fazer autocrítica por ter maculado sua imagem. Por temor de ter seu governo inviabilizado por falta de maioria parlamentar, entregou-se às mãos de aliados duvidosos, perdendo o controle sobre a má companhia. Claro, teria sido derrubado de qualquer forma, porque seu programa de governo jamais seria aceito pelo sistema, mas, pelo menos, teria preservado o capital ético e político. A operação Lava Jato, de propósitos originais dignos de aplausos, terminou desviada, segundo seus críticos, para incorporar o projeto geopolítico dos EUA e do capital financeiro de inviabilizar governos progressistas na América Latina, por não se curvarem ao diktat neoliberal. Isso sempre independeu de corrupção. Esta apenas serviu de gancho para esse propósito. O erro dos procuradores – e grande parte do Judiciário – foi absorver esse discurso neoliberal, a ponto de se investirem da “missão”, indevida, de expurgar o Brasil de tudo que não fosse capitalismo “verdadeiro” (neoliberal), como confessou o próprio Janot, no Fórum de Davos. Tal politização teria sido uma das causas da desestruturação da economia nacional e do desabrochamento do estado de exceção, em curso no Brasil.

Valdemar Menezes

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