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A Prosa e a poesia

2017-08-24 01:30:00
DOIS TIPOS DE FUTEBOL

 

Um olhar dos mais interessantes sobre futebol foi do Pasolini: futebol-prosa e futebol-poesia. Na prosa, ele via a vocação linear do futebol com seus esquemas defensivos, contra-ataques, triangulações e cruzamentos, enfim, o que se combinava fazer.


Na poesia, ele via os movimentos não lineares e imprevisíveis, como a criação dos espaços vazios, a bola de efeito, a liberdade para driblar e criar as jogadas e a manutenção daquela vontade de sempre atacar que dizia ser a marca registrada do futebol brasileiro.


Se considerarmos o momento do nosso futebol em relação aos conceitos do falecido cineasta italiano vemos que o futebol-prosa vai ganhando do futebol-poesia.


Atualmente tem gente defendendo que deve se deixar a bola com o adversário, esperar o erro e contra-atacar.


E justificam dizendo que de posse da bola é difícil penetrar numa defesa, pois todos os jogadores adversários recuam; portanto, é melhor contra-atacar porque o espaço para manobras ofensivas aumenta, e, com dois ou três passes criam-se situações de finalização.


Aliás, o futebol está cada vez mais saindo dos pés dos jogadores. As jogadas imprevisíveis, tão ao gosto da cultura popular, que caracterizavam uma atuação individual como drible de arrodeio, banho de cuia e drible elástico vão desaparecendo dos campos.


E para justificar a sistematização tática e a tendência dos novos tempos, outras palavras vão sendo acrescentadas ao dicionário do futebol: compactação, pressão, preenchimento, intensidade, ataque de espaços, jogo posicional, profundidade, amplitude e mobilidade.


Não vou perturbar o leitor explicando o significado destas palavras, até porque posso me confundir neste exercício, e, num relance, me lembrei de foco, entrega do jogador, superação e terço final do campo. Todas elas fazem parte do atual linguajar de técnicos e comentaristas.


O futebol-poesia que Pasolini viu no Brasil vai rareando. A esperança de um futebol propositivo — mais uma palavra a ser acrescentada — reside na seleção brasileira de Tite. A estratégia e a tática do futebol-prosa do técnico se aliam ao futebol-poesia de Neymar, Gabriel Jesus, Marcelo e Daniel Alves.

 

Sérgio Redes

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