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A grande mudança

2017-09-03 00:00:00

Um presidente da República com popularidade rastejante. Não há povo nas ruas a protestar. Pacotes alvoroçados de privatização foram lançados por esse presidente impopular. Não há povo nas ruas a protestar.


Quando falo de “povo”, leia-se “sociedade civil desorganizada” e não as corporações sindicalizadas com seus uniformes encarnados e financiadas com o dinheiro das “contribuições” obrigatórias dos trabalhadores.

Agora, a economia oferece os primeiros sinais vitais mais concretos. A recessão parece ter chegado ao fim. Certamente, um dado a mais de peso para desestimular e congelar ímpetos militantes.
Fato: privatização deixou de ser um palavrão. Foi o saldo (positivo) da exposição das vísceras das relações promíscuas entre certos políticos, governantes, as estatais, os contratos públicos e uma parte da iniciativa privada.

Como bem escreveu o editor (de livros) Carlos Andreaza em recente artigo no O Globo, a mais importante mudança na percepção popular sobre a atividade pública havida no Brasil desde o fim do regime militar é o surgimento de uma população “difusamente conservadora que — confrontada às evidências de assalto a estatais — parece desenvolver uma compreensão liberal prática, objetiva, sobre os riscos inerentes à dimensão do Estado. Que, em suma, quanto menor seja menos roubado será”. Bingo!

Andreaza foi adiante: “A Lava Jato não terá prestado serviço mais civilizador do que o de exibir, com materialidade, aquilo, por exemplo, de que foi feita a Petrobras: uma empresa desviada para, mais que enriquecimentos pessoais, sustentar economicamente um projeto de poder”.

É a sentença inescapável. Aqui, nesse espaço, venho há anos apontando os vícios dos projetos de poder que moldam suas práticas buscando perpetuar-se... no poder. É evidente que uma imensa parcela da população entendeu como o jogo era jogado. É evidente que essa percepção vai mostrar a cara nas eleições do ano que vem.

RC, CAMILO E O PACOTE DE TEMER
 

Sim, um pacote de privatizações, mesmo mal ajambrado, foi bem recebido pela população. Só os de sempre a espernear. No âmbito nacional, PT, PDT e outros menos votados gritam, alvoroçados, contra o que chamam de liquidação do patrimônio do País. O mesmo que “Temer colocou o Brasil à venda”. Ciro e Lula empunham essa palavra de ordem.

Isso nos remete a um fato cearense que tem lá sua graça. O PT de Lula é o partido de Camilo Santana. O PDT de Ciro é o partido de Roberto Cláudio. O governador e o prefeito são os dois mais estridentes e ardorosos defensores da privatização do Pinto Martins.
Sim, o novo pacote de privatizações de Temer inclui outros aeroportos Brasil afora e segue o mesmíssimo modelo posto em prática para privatizar o funcionamento do terminal de Fortaleza.

Um pacote que incluiu também portos, estradas e outras estatais, como a famosa raspadinha que, nas mãos da CEF, já era negócio privativo de políticos cariocas. Lembram que o famoso Eduardo Cunha era o rei das lotéricas Estatais?

Pois é. Não vai ficar bem reclamar da privatização se no Ceará os governantes do PT e do PDT vibraram e até se envolveram com a venda do aeroporto para uma poderosa multinacional alemã especializada no ramo. Ou, no Ceará pode, mas no Brasil não pode?

DIAS MELHORES VIRÃO
 

Chegará o glorioso dia que, em vez de se construir hospitais que custam os olhos da cara do contribuinte, o governante vai entender que é mais negócio contratar serviços da iniciativa privada. Qual seria o papel essencial do Governo? Simples: garantir que esse serviço seja prestado com qualidade.

Uma vez, ouvi de um importante político do Ceará a seguinte sentença: “É imensa a fila de pessoas para fazer exames. Tem gente que passa um ano ou mais esperando. Muitas vezes, já é tarde demais. Por isso, temos que construir hospitais no Interior.”

É mesmo, cara pálida? E que tal contratar os exames da iniciativa privada? Com pacotes de exames contratados, uma rede de clínicas e hospitais privados atenderiam fácil, fácil a demanda.

Assim, não seria preciso construir hospitais, contratar funcionários, contratar corpo médico e muito menos comprar os caros equipamentos de ponta para fazer exames. E também não teria o alto custo de manutenção. Mas, aí não tem graça, não é?

Não é só isso. Um grande hospital público tem um efeito colateral pouco abordado. Uma fonte no atual Governo me contou: o hospital regional do Cariri fez com que vários pequenos hospitais e clínicas privadas fechassem na região. Ou seja, além de levar alguns à falência, nem o aumento da quantidade de leitos aconteceu na região.
 

E na área da educação? Que tal se em vez de construir escolas, contratar professores e funcionários o Governo optasse por contratar vagas nas escolas privadas, incluindo as já existentes? Muitas poderiam ser construídas por particulares para receber a leva de alunos. Lula fez isso no ensino superior, não fez?

Vai sim chegar o dia em que a racionalidade vai imperar no setor público e na opinião pública. Então os tabus acima simplesmente vão deixar de ser tabus. O serviço é público, mas pode ser prestado pela iniciativa privada. É exatamente assim com a recolha do lixo domiciliar e com o transporte urbano, os dois serviços públicos sempre melhores avaliados em pesquisas populares.

Esse caminho pode ser trilhado sem pressa, de forma comedida, analisando cuidadosamente os efeitos e fazendo os ajustes necessários.

CONTRADIÇÃO
 

Pelo andar da carruagem, chegaremos em 2018 com Michel Temer na Presidência, com a economia em crescimento e os índices de desemprego em queda. Hoje, é esta a hipótese mais plausível, muito embora a nossa política não seja amiga das plausibilidades. Mas, como estará o presidente em relação à campanha eleitoral? Muito provavelmente, Temer será tóxico para o candidato de sua simpatia. Portanto, é muito provável que se torne um personagem sem grande relevância no processo eleitoral.
 

Teríamos então algo inusitado: um presidente politicamente tóxico e impopular no comando de uma economia em círculo virtuoso.

PREVISÃO

Aviso aos navegantes: o contexto político continua sugerindo que as eleições de 2018 serão federalizadas. Ou seja, as alianças que se formarem para disputar a Presidência da República tendem a se reproduzir nos estados. É o fruto do impeachment, que clareou os campos partidários. A própria esquerda tenderá a baixar normas proibindo alianças com os que chama de “golpistas”. É claro que o inverso tende a se concretizar também. O fator que pode mudar esse rumo? Resposta: a divisão dos governistas com o lançamento de diferentes candidatos a presidente.

Fábio Campos

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