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Um dinossauro cearense que desbotou

2017-11-05 00:00:00
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Por José Evangelista

 

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Na entrada do Campus do Pici da UFC, debruçando-se sobre um parapeito no alto do prédio da Seara da Ciência, um feroz animal pré-histórico parece rugir para os passantes. Um desses espantados transeuntes arriscou o palpite de que se trata da “estauta de um dragão”. Na verdade, é a reprodução bastante especulativa de um dinossauro que circulou pela região que hoje se conhece como a Bacia do Araripe, no sul do Ceará. Feito de fibra de vidro e pintado com laca automotiva, a obra do artista cearense Francisco Ferreira representa um Angaturama limai, exemplar de espinossauro descrito por Alexander Kellner e Diógenes Campos em 1996. Media em torno de oito metros de comprimento e três de altura, e viveu há cerca de 110 milhões de anos. Segundo os paleontólogos, naquele tempo havia por aquelas bandas um grande lago de água salgada de onde o bicho tirava os peixes que eram sua comida de preferência. Seu nome foi dado em homenagem ao professor Murilo Lima, que encontrou o primeiro fóssil do animal perto de onde hoje fica a cidade de Santana do Cariri.


Como fósseis de outros espinossauros semelhantes ao Angaturama foram encontrados na África, os cientistas consideram que essa é mais uma evidência da separação entre os continentes, ocorrida há muitos milhões de anos.


Uma dúvida comum entre as crianças e adolescentes que visitam a Seara é bastante pertinente: como sabemos que esse dinossauro tinha o aspecto mostrado no modelo que habita o prédio? Como podemos ter certeza sobre as vistosas cores que o animal ostenta? Ou melhor, ostentava, pois a ação do sol e da chuva desbotou a fera que tem agora um aspecto esverdeado meio triste. O dragão do Pici virou uma enorme lagartixa.


Segundo o professor Alexandre Sales, da Universidade Regional do Cariri, que pesquisa esses fósseis, não se sabe ao certo como era o aspecto real do Angaturama, nem da maioria dos dinossauros que vemos nas gravuras e no cinema. Até em relação aos dinossauros muito estudados, como o Tiranossauro Rex, não há nenhuma certeza sobre a textura e a cor de sua pele, pois os pigmentos não são preservados. Hoje em dia, muita gente acredita até que, alguns deles, mesmo os maiores carnívoros, talvez tivessem penas. E essas penas poderiam ser bem coloridas, como as de alguns pássaros modernos. Mas, como penas não produzem fósseis, a real representação desses animais extintos é quase só especulativa.


As cores meio carnavalescas do modelo original do Angaturama da Seara, para dizer a verdade, tinham a intenção declarada de atrair o olhar dos visitantes, principalmente da garotada, já que a Seara se esforça para encantar os mais jovens com objetos e experimentos interativos de ciências. Só que, além dessa questão duvidosa das cores do dino, a pose do bicho com uma mão pousada sobre o parapeito incitou comentários acerca de sua masculinidade. Isso é bobagem, é claro, pois, além de estar em perfeita consonância com os costumes atuais, o modelo poderia muito bem ser de uma dinossaura. Para escandalizar ainda mais os preconceituosos, talvez valesse a pena pintar as unhas do dragão de vermelho vivo.


Mais pertinente foi uma preocupação que os professores da Seara tiveram com a segurança dos motoristas que passam pelo local. Ao saírem do túnel que fica sob a avenida Bezerra de Menezes, eles se deparam de repente com aquela visão de um bicho cheio de dentes e garras afiadas rugindo sobre um prédio mais adiante. Felizmente, essa preocupação demonstrou-se exagerada, pois até hoje nenhum acidente ocorreu nas redondezas que pudesse ser ligado a essa causa.

 

De qualquer forma, em breve, o Angaturama da Seara voltará a ostentar as cores vivas que tinha quando foi inaugurado como o guardião do prédio. Um artista já foi encarregado de recuperar o aspecto do modelo original que deverá estar pronto antes do Natal. Sem penas, infelizmente, mas bem vistoso e festivo como se espera de um atrator de jovens curiosos pelas maravilhas da ciência.


Adriano Nogueira

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