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Morte de adolescente continua sendo investigada no Barroso
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Morte de adolescente continua sendo investigada no Barroso

| SEGURANÇA PÚBLICA | Caso ocorreu em 2018. MP espera laudo cadavérico para apurar versão de adolescente baleado, que afirma ter tido execução
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Condomínio Babilônia. Obras do residencial, no Grande Jangurussu, não foram concluídas pela Prefeitura de Fortaleza (Foto: Fábio Lima)
Foto: Fábio Lima Condomínio Babilônia. Obras do residencial, no Grande Jangurussu, não foram concluídas pela Prefeitura de Fortaleza

Passado mais de um ano, as circunstâncias da morte do adolescente Emerson Alves Feitosa, 17, ainda são investigadas. Ele foi morto por policiais militares em 5 de fevereiro de 2018, na comunidade da Babilônia, no bairro Barroso. Conforme a versão dos militares, o jovem integrava um grupo de cinco pessoas que atirou contra a composição.

Os PMs, do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate), haviam dado voz de parada ao grupo ao flagrá-los com armas em punho, em plena via pública. Além de Emerson, outros dois adolescentes foram baleados. Um adolescente de 14 anos e Emerson foram encaminhados a um hospital pelos próprios PMs, mas este não resistiu.

A versão do adolescente sobrevivente, no entanto, é de que houve execução. Em depoimento à Polícia Civil, ele disse ter sido, durante abordagem, colocado sentado e agachado pelos PMs, ao lado de Emerson. Nesse momento, um dos policiais teria passado a disparar em sua direção. O adolescente disse ter sido atingido nas pernas e no peito.

"Ao cair no solo, o menor afirmou que viu quando um dos militares disparou contra o peito do menor Emerson que veio a falecer posteriormente. Por fim, o declarante relatou que, antes de desmaiar, percebeu que um dos policiais militares informava no rádio que teria havido um tiroteio, tendo elementos feridos em meio ao confronto", consta em parecer do Ministério Público juntado ao processo, ao qual O POVO teve acesso.

No documento, o MP chegou a afirmar que exame de lesão corporal é compatível com o relato do jovem. “Na análise do exame, conclui-se que, os ferimentos causados pelos disparos possuem características de tiros feitos a curta distância (execução), visto que, ao redor das lesões há zonas de esfumaçamento (queimada ou encrostada), indicando a proximidade dos disparos realizados pelos militares”.

O promotor que acompanha o caso, no entanto, ainda solicitava, em janeiro último, o envio do laudo cadavérico referente a Emerson. O documento só passou a constar no processo em 12 de abril último. A Justiça abriu vistas para o MP analisar o documento. O promotor Sebastião Basilino Freitas disse a O POVO, em 4 de abril último, que somente esse exame pode determinar se houve ou não execução. As queimaduras identificados no laudo referente ao sobrevivente que poderiam caracterizar execução também poderiam indicar arrastamento, queimadura deixada na pele pelo projétil antes da perfuração. “O laudo não nos é esclarecedor”.

Em nota, a Perícia Forense afirma que o laudo foi encaminhado à Polícia Civil. A SSPDS afirma que o 16º Distrito Policial (16º DP), que apura o caso na esfera civil, pediu dilação do prazo para a conclusão do inquérito. Já a PM afirma que o IPM foi concluído. "O processo encontra-se na justiça militar, a quem compete sua solução". A corporação não respondeu se algum dos militares foi afastado. 

Dos 11 policiais militares investigados, 5 estiveram envolvidos na operação que buscava evitar ataque a dois bancos em Milagres — caso ocorrido em dezembro último, que resultou na morte de 14 pessoas, sendo seis reféns. Nenhum dos policiais foi indiciado, motivo pelo qual O POVO opta por não divulgar os nomes deles.

Raio lidera as ações investigadas

Um a cada cinco inquéritos policiais militares (IPMs) instaurados pela Polícia Militar do Ceará em 2018 investigou ações do Batalhão de Policiamento de Rondas de Ações Intensivas e Ostensivas (BPRaio). Foram 110 investigações contra o Raio ao longo do ano. O levantamento consta em balanço da Coordenadoria de Feitos Judiciários Militares da PM, publicado em março último no boletim interno da corporação, ao qual O POVO teve acesso.

Ao todo, 515 IPMs foram instaurados no ano passado pela PM, aponta a coordenadoria. O número é maior que o registrado em 2017, quando foram 379 procedimentos registrados. Desde 2013, a PM abriu 1.966 investigações do tipo.

Os IPMs abertos contra policiais do Raio cresceram quase quatro vezes em relação a 2017, quando foram abertos apenas 32 IPMs contra o então batalhão. Os 110 inquéritos abertos no âmbito do Raio representam mais que o dobro dos procedimentos abertos contra a segundo unidade da PM mais investigada, o 16º Batalhão de PM, que atua em Messejana e outros bairros. Foram 43 IPMs. O Batalhão de Policiamento de Choque (BPChoque), onde encontra o Gate, teve 38 procedimentos instaurados. Oito unidades da PM não tiveram nenhuma investigação aberta.

O POVO buscou o comando da Polícia Militar para ter mais informações sobre os procedimentos, incluindo infrações mais investigadas, número de processos arquivados e aumento do efetivo do Raio. A PM, no entanto, não respondeu até o fechamento desta edição.

O promotor Sebastião Basilino Freitas observa que as infrações que mais chegam à promotoria dizem respeito a crimes militares. São casos de desobediência, deserção ou apresentação de atestado médico falso, por exemplo. "Em seguida, vem a lesão corporal e, em menor número, os homicídios".

Ônibus incendiado na Babilônia
Ônibus incendiado na Babilônia

Morte gerou protesto

Na manhã seguinte à morte de Emerson, um ônibus foi incendiado na comunidade por homens mascarados. Na ocasião, a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) afirmou que inquérito policial apuraria a relação do incêndio com a morte de Emerson.

Em nota, a pasta ainda afirmava que Emerson possuía três passagens na Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA) por atos infracionais análogos ao crime de roubo. A ação policial ainda resultou na apreensão de dois revólveres, com 12 munições, sendo duas deflagradas. Em agosto de 2018, o adolescente sobrevivente viria a ser apreendido com drogas e um revólver, ao lado de mais duas pessoas.

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