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Briga no golpe

2017-06-17 17:00:00

O Brasil acompanha o rescaldo da briga entre os poderes, desde que a Veja denunciou suposta espionagem do ministro Edson Fachin pela Abin (supostamente a mando de Michel Temer). Isso provocou notas e contranotas dos chefes do Judiciário e do Executivo. Também houve ameaça de se usar a CPMI da JBS contra Fachin, além da protelação, pelo Legislativo (Senado), do afastamento do senador tucano Aécio Neves do cargo, determinado pelo ministro. Nesse ínterim, o PSDB resolveu continuar apoiando um governo acuado e agônico, aparentemente em troca da promessa de receber apoio do PMDB em 2018. Mas, o guru do partido, FHC, no dia seguinte, teve o bom senso de defender as diretas. E agora?

DESAVENÇAS
As desavenças surgidas entre as forças golpistas são patentes. Quem abocanhou o governo foram os segmentos mais fisiológicos da representação política brasileira, cujos “malfeitos” estavam sendo rastreados pela Lava Jato (embora a prioridade fosse o PT) já que participavam da base do governo petista. Ora, era preciso remover tudo que desse sustentação ao projeto do PT, malvisto pelo mercado financeiro por estar na contramão deste. Interessava igualmente a Washington (no rastro de sua política de contenção da Rússia e da China) enfraquecer o Brasil, por ser um dos fortes sócios do Brics e, também, o elo mais importante da aliança de governos progressistas da América do Sul. Era intolerável para Wall Street e seus aliados brasileiros a derrota, nas urnas, pela quarta vez consecutiva, do projeto neoliberal (PSDB).

TUMOR
O tumor da corrupção - que a espionagem americana havia detectado (segundo Edward Snowden), na Petrobras e em outros segmentos da estrutura pública brasileira - foi a brecha encontrada para acionar o alentado projeto ianque de desestabilização do governo petista. As pistas teriam sido repassadas a quadros da magistratura, do ministério público e da polícia que haviam sido convidados a ir aos EUA fazer cursos de capacitação no combate a crimes contra o sistema financeiro (segundo Wikileaks). A investigação ganhou corpo a partir da montagem da Operação Lava Jato: enquanto os investigadores buscavam rastreá-la e identificar seus agentes (embora numa operação estranhamente descasada das políticas estratégicas de Estado em curso) a arapongagem americana (interessada em golpear o Brics, desestabilizar o governo da esquerda e abocanhar o pré-sal) apontava o “caminho das pedras”: as velhas forças fisiológicas às quais o PT se aliara com vistas a obter a maioria parlamentar para governar.

TRAMA
A tática inicial foi desacreditar o PT perante a grande massa, fazendo-o responsável exclusivo pela corrupção. A investigação seguiu um roteiro estreitamente conjugado ao da disputa política pelo poder, em curso no País, a ponto de se mesclar com ela. Ao se deparar com indícios de “malfeitos” de membros da oposição,
tornou-se comum a justificativa: “isso não vem ao caso”. Simultaneamente, “vazamentos” seletivos bombardeavam dia e noite o PT, numa política de “terra arrasada”, vista pelos críticos como forma de criar um clima de linchamento moral e de prejulgamento a fim de produzir os resultados políticos desejados. Mas, isso não era tolher o devido processo legal e violentar a Constituição? Sim, mas, as instituições encarregadas de zelar pela integridade do Estado Direito foram, então, devidamente intimidadas pelo “clamor das ruas”, açulado por poderosos meios de comunicação.
 

EXCEÇÃO
Uma versão corrente entende que, então, as forças fisiológicas da base governamental (lideradas por Eduardo Cunha, Michel Temer e sua trupe), vendo-se cercadas, entabularam negociações com o sistema oferecendo-se para derrubar Dilma e implementar o programa da chapa derrotada (e dos “mercados”): neoliberalismo, desmonte do Estado Social, corte de direitos trabalhistas e previdenciários, entrega do pré-sal às multinacionais petroleiras e alinhamento do Brasil aos interesses geopolíticos dos Estados Unidos, em troca de se “parar a sangria”. O Estado de exceção desnudou-se quando uma conversa entre a presidente da República e seu antecessor foi grampeada e divulgada ao público, ilegalmente, sem qualquer punição ao juiz responsável. O cúmulo foi a condução coercitiva de Lula (coisa que só poderia ter acontecido – como reza a lei – se ele tivesse sido intimado a depor e se recusado). Em nenhum País democrático, Sérgio Moro seria considerado com isenção para continuar à frente do processo contra Lula, depois disso.

E OS “RUSSOS”?

Cumprida a primeira parte do acordão (impeachment e imposição do neoliberalismo), a segunda parte (“parar a sangria”) degringolou, por conta do descontrole das investigações, da delação da JBS e do fracasso da política econômica, gerando divisão entre os golpistas. Uma parte, após ter obtido o principal (queda se Dilma e mudança no modelo econômico) não se importa em atirar Temer ao mar. Mas, ambas estão unidas no propósito de manter o modelo neoliberal entreguista, seja quem for o presidente substituto. Isso é intocável. Falta apenas combinar com os “russos” (sociedade).

Valdemar Menezes

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