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As pedradas dos black blocs

17:00 | 01/07/2017

Talvez nos falte a potência dos black blocs. Sim, a agressividade impassiva diante do que nos fere de morte. E não há, aqui, uma apologia ao quebra-quebra, às pedradas, ao tocar fogo. Mas um reconhecimento ao querer que as coisas não permaneçam na normalidade.


É porque somos meio covardes, ativistas de barzinhos, futriqueiros de Facebook... E nossas revoluções não passam de discursos cheios de concessões para que as coisas mudem, mas não mudem tanto se forem nos deslocar o corpo acostumado.


E alguns idiotas tecem teses provando que a “pedrada” de um bloc na vidraça
do Palácio é mais criminoso do que a morte de centenas de Zé Manés com
chikungunya, dengue, lixo, fome, falta de escola e saneamento...


Ora, ora, não é violento nascer e morrer na miséria? Ser assassinado antes dos 18 ou 20 e poucos anos? Não é uma brutalidade, uma baderna, para usar o jargão dos babacas, crescer e repetir a mesma história do pai subempregado e da mãe - eterna doméstica?


E a falaciosa conversa das oportunidades iguais para os que nasceram na Aldeota e no Bom Jardim? Moro na Aldeota porque é um pouco menos inseguro, fede diferente, porque fui estudante da UFC e não tenho que me preocupar com a fossa estourada.


Nossas revoluções são estranhas. Precisou de uma lei para que assinássemos a carteira das empregadas. Enquanto não, era normal trazer meninas do Sertão para criar nossos filhos e lavar nossas calcinhas e cuecas. Mal podiam com os bebês alheios!


Tenho certa inveja dos black blocs genuínos. Os que não aceitam propina para matar na fila da falta de leitos nos hospitais. Mil vezes os mascarados aos “não vândalos” de caras limpas que destroçam a Transpetro, que devassam a Petrobras, que se eternizam nos golpes...


Não há porvir nos blocs. Pena não conseguirem ir além da pedrada, além do fogo, além do quebra-quebra. Mas há uma potência ali. Algo mais do que a retórica revolucionária em torno do vinho ou da cerveja... E fica tudo por isso mesmo e não passamos do assombro e do desalento de querer ir embora.


DEMITRI TÚLIO é repórter especial e cronista do O POVO demitri@opovo.com.br


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